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Gostava de não chegar ao ponto de escrever este texto.
Na semana anterior não houve texto do Falar Criativo, não consegui, o meu corpo não deixou.
Há alguns anos que tenho episódios de dores de cabeça, sempre quando me levo longe demais, sempre que a mente tenta obrigar o corpo, este responde de volta obrigando-o a parar.
Pois, foi o que aconteceu, chegou a altura de escrever o texto e publicar e não foi possível, a dor de cabeça era tão intensa que me fez vomitar, e me atirou para a cama às oito da noite, muito longe das onze, meia noite que costumam ser a norma.
Percebi a mensagem, mas logo veio a sensação de falha, de ser um impostor, ando eu aqui a escrever textos a dar ideias sobre como nos focarmos, sobre como lutarmos por aquilo que queremos, sobre sermos seres humanos de alta competição , e o que acontece? Falho, falho redondamente na minha própria vida.
Como disse no último texto, estou cheio de projectos, coisas a andar que fui semeando e que agoram começam a dar frutos, mas tal como na natureza é necessário manutenção, cuidar das árvores, regar, carregar os frutos.
Não planeei bem as culturas que fiz, semeei tudo ao mesmo tempo, culturas que germinaram na mesma altura, o que implicou que todo o trabalho associado aconteça ao mesmo tempo.
Quando o terreno está vazio há a tentação de rapidamente o encher, com tudo, há a mentalidade que estamos em falta, que temos de compensar o tempo perdido, que temos de prever o futuro, que temos de fazer o possível e o impossível.
Mas a natureza tem os seus tempos, nós como parte da natureza temos também os nossos tempos, no entanto a natureza é bem mais sábia, respeita-se. Faz-me lembrar a história que a anterior convidada Joana Rita Sousa me contou na entrevista sobre um limoeiro que levou anos a dar dois limões, aqueles que lhe era possível dar, mas que depois se tornou um limoeiro produtivo. Foi quando pôde ser, não quando queriam que fosse.
Temos a propensão a apressar processos, a avançar a partir de um local de pouca clareza associada a uma mentalidade de escassez.
Do outro lado do espectro está a procrastinação, o medo de fazer por medo de não fazer ao nível que achamos que “deveríamos” fazer.
Mas será que está do outro lado do espectro?
Pois, talvez não esteja, em ambos os casos há um desrespeito pelo que somos, por aquilo que podemos fazer em determinado momento.
Chegar ao ponto de sermos obrigados a parar é falta de planeamento, falta de tolerância, mas sobretudo a soberba de acharmos que controlamos tudo, que o sol e a chuva necessários para as nossas culturas são geridos por nós.
Devemos semear mais do que aquilo que conseguimos colher, nem tudo vai pegar, nem tudo vai dar frutos, e se por um acaso, tudo começar a dar ao mesmo tempo, devemos aceitar que vai haver fruta caída no chão, que não vamos apanhar tudo, ou podemos chamar os vizinhos para colher connosco e partilhar o resultado do nosso esforço.
O facto de não ter havido texto na semana passada é o exemplo de fruta caída no chão, havia ouvintes à espera de texto que não apareceu, mas ao contrário do que emocionalmente sentia, a terra não parou, o céu não desabou por eu não ter escrito um texto.
Hoje, sábado, com mais calma pude escrever este texto, depois de dormir, de descansar, de respeitar que por vezes só conseguirei dar dois limões, e quando as condições forem as certas encher-me de limões que poderei partilhar com todos.
Fica a sugestão, planear os tipos de culturas, umas de inverno, outras de verão, e caso o ano se revele melhor que o esperado, deixar fruta caída no chão, irá servir de adubo ao solo que alimenta a árvore de onde caiu, tal como o meu episódio serviu para escrever este texto.
Dúvidas ou sugestões rui@falarcriativo.com
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