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“Aquele que conhece os outros é sábio; aquele que se conhece a si próprio é iluminado.”
― Lao Tzu
Qual a importância de nos conhecermos melhor do que aquilo que os outros nos conhecem?
Yuval Noah Harari, autor do famoso livro Sapiens, recomendado por Bill Gates, Mark Zuckerberg, e Barack Obama, referiu numa entrevista que antes de existirem as ferramentas que hoje temos para o estudo do comportamento dos utilizadores, consumidores, tais como o uso que damos aos telemóveis, ao sites que visitamos, aquilo que clicamos, não era essencial que nos conhecêssemos a fundo, porque os outros não tinham maneira para o fazer.
O que acontece hoje é que com todas estas ferramentas que os outros têm, conhecem-nos tão bem ou melhor que nós, passando desse modo a ter a capacidade de nos influenciar, ao mesmo tempo que nos fazem sentir que temos poder de escolha, que as decisões continuam a ser nossas, que temos o controlo da situação.
No caso do Yuval, ele preferiu não ter telemóvel por saber que o tempo e atenção que lhe consome são mais valiosos colocados na escrita de livros, estudo, ou mesmo tempo livre.
Desengane-se quem acha que poderá ganhar aos “Facebooks”, “Instagrams”, ou qualquer outra rede social, eles têm especialistas em comportamento a ganhar muito dinheiro para tornar estas experiências cada vez mais viciantes.
Consegues estar longe do do telemóvel?
Sentes aquele vício de olhar para o telemóvel quando não tens nada para fazer, ou quando estás à espera de alguém?
Eu sofro desse mal.
No entanto já vou conseguindo identificar essa necessidade, já consigo parar, olhar para esse impulso como automático, e escolho não ceder à tentação irreflectida.
Inquieto muito algumas pessoas que conheço, começo a perguntar o porque é que fazem determinada coisa, e muitas vezes não me conseguem responder rapidamente, não sabem, nunca pensaram nisso. A seguir, algumas começam a dizer que não é errado aquilo que fazem, ao que eu lhes digo que não estou a perguntar se é certo ou errado, só quero que tenham a consciência porque o fazem, e aí sim, tomarem uma decisão consciente de continuar ou parar.
O facto de nos magoarmos a fazer algo, de ter dor associada, física ou emocional, faz com prestemos maior atenção à situação em causa, mas por vezes não é suficiente para mudarmos o comportamento.
Isto faz-me lembrar uma reportagem que vi há uns anos sobre uns caçadores de macacos que usam armadilhas muito simples, porém muito eficazes, devido ao comportamento obsessivo dos mesmos.
Os caçadores colocam sal na fenda de uma árvore oca, os macacos enfiam a mão aberta na fenda, agarram o sal e tentam tirar a mão, mas com a mão fechada não conseguem tirar, ficando presos. Os caçadores vêm e batem-lhes com paus, até os deixarem insconscientes ou matarem.
A única coisa que os macacos têm de fazer é largar o sal.
Eles vêem os caçadores aproximarem-se, levam os primeiros golpes, e nem assim largam o sal.
Qual é o teu sal?
Sim, eu tenho visto no meu caso que algumas coisa que tenho feito são sedutoras, e nem quando levo pauladas no lombo as largo, arriscando a que me possam deixar inconsciente ou me matem.
Ao longo dos tempos têm sido muitos os sábios que nos falam da importância de nos conhecermos, o que acontece é que assim que a paisagem interna é menos sedutora, nos confrontamos com partes de nós que não vemos como perfeitas, agarramos um sal qualquer, um telemóvel, um site, uma série inteira no Netflix, um copo de vinho, um chocolate.
Não falo como alguém que não sofra deste mal, falo de alguém que a pouco e pouco, através destas reflexões começa estar mais consciente que é essencial saber realmente e profundamente, quem sou e porque faço o que faço.
Na semana passada não houve texto, não tive tempo, poderia ter mantido o punho fechado e levado uma paulada do meu corpo, da minha família por não estar com eles, escolhi abrir a mão, mas não fugi para o telemóvel, fiquei a pensar que estava a falhar, consegui ver que ainda me falta aceitar que não vou conseguir fazer as mil e uma coisas que brilham e me seduzem, que tenho necessidade de aprovação por parte dos outros, que me sinto menos de cada vez que acho que estou a falhar perante alguém, e que dessa forma irão gostar menos de mim.
Mas depois estar nesse sítio escuro, abri a janela, reparei que o mundo continua a girar, e que o facto de ter menos downloads não coloca em causa o valor que aquilo que faço tem, nem aquilo que sou enquanto pessoa.
Hoje há texto, há sol, há vontade de me conhecer melhor, sabendo que não vou gostar de tudo, mas que viver o escuro e o claro, o dia e a noite é bem melhor que viver sempre à luz de uma lanterna que outros seguram, e que dessa forma me podem tornar apenas uma sombra projectada numa parede.
Dúvidas, sugestões, rui@falarcriativo.com.
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