Skip to content

Simplesmente recomeçar

Penso que posso dizer que todos, ou quase todos já ouviram a expressão, ou alguma semelhante a “quando se fecha uma porta abre-se uma janela”, algo que nos faz acreditar que quando levamos com uma porta na cara, coisas boas se seguirão.

Então e quando se fecham portas atrás de portas, e nada de janelas, e nenhuma luz entra?

Podemos ficar a reclamar das portas que se fecham, podemos ficar à espera da tal janela, podemos chorar por achar que nunca se vai abrir uma janela, mais nenhuma porta se abrirá para nós, ou, podemos aceitar a dor que sentimos por aquela porta que tanto gostávamos ter fechado, permitir-mo-nos ter aquele sofrimento, em vez de procurar a primeira janela que apareça, desesperados, tendo que nos contentar com uma mera fresta.

Ninguém gosta de portas fechadas para mundos que nos trazem, ou trouxeram felicidade.

Mas se pensarmos de outra forma, podemos estar apenas a evitar uma corrente de ar por termos demasiadas portas abertas, fazendo com que nos constipemos, e na maior parte dos casos fiquemos indecisos sobre qual porta escolher.

Na expressão da porta que fecha e a janela se abre, ninguém refere se aquela é a única porta, ou se além da porta não temos mais janelas, pode simplesmente ser o fechar da porta após a saída do último convidado em que ficamos novamente sossegados em casa depois de um bom jantar com amigos.

Mas mesmo admitindo que só tínhamos uma porta, que se fechou, fechou-nos fora ou dentro de alguma coisa?

Estávamos a tentar entrar ou a tentar sair?

Se estávamos a tentar entrar podemos continuar a andar, respirando o ar fresco do exterior buscando uma nova porta, um novo desafio. Se estávamos a tentar sair e a porta se fechou, talvez seja uma oportunidade para descansar, para dormir, para pensar no que queremos fazer a seguir, sem interrupções, com tempo, com sossego.

Parece que estou a tentar mostrar o copo meio cheio, que a vida é sempre positiva, não é, apenas estou a tentar mostrar que o copo é meio cheio, é meio vazio, que o copo pode ser de vários materiais, pode-se partir, que em todas a situações há sempre várias maneiras de olhar para as questões, e cabe a nós procurá-las e escolher a que melhor nos serve.

Vamos acertar sempre na escolha?

Longe disso, vamos derramar o copo, vamos ficar com sede, vamos partir o copo, vamos atirar o copo a alguém, vamos levar com vinho na cara, espirrar por causa do gás na bebida, levar com limonada nos olhos, vamos sonhar com sumo de laranja enquanto bebemos água morna…

Agora, podemos sempre, simplesmente recomeçar.

Adoro este conceito, de sem grandes dramas, sem falsas expectativas, sem culpa, sem remorso, simplesmente recomeçar.

Quando algo não corre da maneira que desejamos temos a tendência, para culpar outras pessoas, as situações, o mundo, e muitas vezes a nós próprios.

Melhoramos, mudamos alguma coisa quando ficamos nesse sítio, nesse lugar de acusações, de culpabilização?

Não, talvez possa acontecer uma num milhão, mas será raro.

E se sem dramas, sem remorsos, sem culpa, simplesmente recomeçarmos?

Sem mais nada, só voltar a abrir outra porta, até pode ser a mesma, a porta pode ter fechado porque fomos nós a bater com a porta, num momento de exaltação.

Lembrei-me desta expressão, que não é minha, é do Joseph Goldstein, quando esta semana, por estar focado noutra coisa, respondi de forma mais áspera à minha filha mais nova.

Parei por momentos, aceitei que não tinha sido a melhor resposta, reparei que tinha fechado a porta, não fiquei a martirizar-me com o sucedido, mudei o tom, pedi desculpa, mudei a atitude, e recomecei, abri novamente a porta sem ter que desesperadamente procurar uma janela de justificações, culpabilização, remorso, ou uma fuga rápida de um lugar desconfortável.

Consigo fazê-lo sempre? Não, gostaria, mas cada vez que o faço sei que conta.

As janelas são coisas maravilhosas, permitem que o ar entre, permitem que a luz entre, mas se queremos andar direitos devemos usar as portas para entrar e para sair.

Fugir pela janela pode ser muito perigoso, podemos magoar-nos, pode ser um andar alto, pode ser uma janela estreita onde raspamos as costas, onde esfolamos os cotovelos e pode até ter grades.

Não vale a pena complicar, é simplesmente recomeçar.

Comments are closed, but trackbacks and pingbacks are open.