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O convidado desta semana é o Afonso Cruz, escritor, ilustrador, realizador, e músico, que eu há muito gostava de ter entrevistado, desde que ouvi a entrevista que ele deu à Inês Meneses no Fala com Ela, mas que me fez ir adiando, pois acho que a conversa entre os dois foi muito boa, e havia o receio de me comparar, e falhar.
Mas um destes dias, ao ler um texto do Afonso, partilhei-o e na partilha disse que gostava de conversar com ele. Minutos depois, o Filipe Lopes, anterior convidado, e a Edite Amorim anterior convidada, puseram-me em contacto com ele através do facebook, o que mostra que estamos todos muitos próximos e disponíveis para ajudar.
Combinámos o dia e eu iria deslocar-me a Avis no Alentejo, onde ele vive, mas sorte a minha e disponibilidade dele, veio à Feira do livro de Lisboa, e acabou por passar antes cá em casa para conversarmos.
O Afonso é um grande escritor, com prémios já no seu currículo, e acho que vai ser ainda maior, tem uma maneira cativante de escrever, muito criativa, é produtivo, e tem a noção do ofício da escrita, algo que faz faltas a muitos de nós, nos quais me incluo, esta noção que há um lado oficinal, pragmático quando queremos desenvolver a nossa arte, seja ela escrever, pintar, desenhar, inventar, e até fazer podcasts. A repetição, a tentativa, a experimentação, são ferramentas essenciais para o crescimento, a evolução, é nestas iterações que percebemos o que faz ou não sentido, onde podemos melhorar, e de que forma.
O seu processo criativo é interessante, trouxe-o da animação onde trabalhou, onde define um início, e um fim, e um meio, e vai preenchendo os meios que existem entre dois momentos, simples e eficaz. Tenho reflectido sobre esta maneira de trabalhar, e admito que me agrada como estrutura de trabalho, e até como estrutura de vida, pois, torna-nos conscientes de onde estamos, o nosso início, estabelecemos um fim, o objectivo a alcançar, e vamos pensando como poderemos ir preenchendo as partes que ainda não sabemos, mas que podemos apontar como possibilidades, com a vantagem de sermos tolerantes com as mudanças de objectivos, caso faça sentido, e atentos às respostas que nos podem surgir, uma vez que vamos construindo uma narrativa que vai ganhando sentido, com pontos intermédios aos quais vamos apontando.
A entrevista é longa e cheia de sabedoria, de alguém que tem tido confiança no seu trabalho, que tem a coragem de ser freelancer desde o início da sua carreira, coisa que eu gostaria, mas não tenho a coragem, pois ao contrário dele, se o mês se aproxima do fim e não há muito trabalho/dinheiro, acredito mais que ele não vai surgir, do que tudo se resolverá e vai correr bem. Percebo que o seu método, a sua experiência, não são comparáveis à minha, percebo que o trabalho com espinha dorsal tem muito mais possibilidade de ser bom. Se eu partir para uma viagem sem saber para onde vou, porque vou, dificilmente encontrarei aquilo que pretendo, serei apenas alguém à deriva, e esse tem sido muito do meu percurso, arrancar sem destino nenhum, como diziam os Trovante na sua 125 Azul, e embora me tenha encontrado com muita gente interessante, não sinto que tenha feito nada digno de nota. Talvez me exija demasiado, mas provavelmente a minha insatisfação, seja o motor para continuar a fazer, para fazer mais e melhor.
Vou tentar desenhar as minhas ideias e projectos desta forma, preencher espaços, pergunta a pergunta.
- Livro do Afonso que tenho, “Enciclopédia Universal da Estória Universal”, e que falamos durante a entrevista.
- Livro que falamos no fim, “Cartas a Lucílio” de Lúcio Aneu Séneca.
Foto: Vitorino Coragem
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